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Perspectivas & Olhares na planície

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P&O na Planície: Bom Fim de Semana 144

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P&O na Planície: Bom Fim de Semana 144 = Não há palavras. Diz-se: pouco há a dizer, pouco há a escrever. Por vezes, não há mesmo palavras capazes de demonstrar o sofrimento como descrevem as lágrimas a escorrer inconscientemente pelo rosto.

Na flor da idade: perdem-se dois jovens, irmãos, que tinham muito para viver, conquistar e vencer. Realizaram, certamente, muitos objectivos. Tantos outros ficarão por cumprir.  Ficarão a fazer falta aos pais que de uma forma natural viveram para eles antes de conseguirem trilhar os seus próprios trilhos. Dizem que quando nascemos a única coisa que temos marcada é a nossa morte. Nessa data não conseguimos mexer. Mas, como não conseguimos se nem sabemos qual será a nossa hora. Os porquês de se ver interrompido a passagem da idade para eles, ninguém saberá responder. Nunca existirá uma resposta. Numa vida há muitas vidas. Resta respeitar as incidências que nunca serão ultrapassadas para a família. 

Na flor da meia idade: uns pais vivem o maior pesadelo contra-natura: enterrar os filhos. A dor dilacerante de uma mãe que os fez nascer e agora está a ter a missão de os sepultar, é asfixiante e uma enorme impotência que toma conta de todo o corpo se não for amparado, desfalece no chão. A aflição destes pais são gritos calados que se ouvem longe. Terão os netos para tentar continuar a jornada da vida,  porém o vazio da perda dos filhos nunca será preenchido pelos netos. Somos seres únicos e insubstituíveis. Se tudo fosse correcto acontecia o acrescentar de cadeiras e não a supressão. Aprende-se a sobreviver com o desgosto da perda visceral,  aquela que os pais do Diogo Jota e André Silva estão obrigados a viver e não se ultrapassa. Recordar e ver detalhes de personalidade ou gestos do filho nos netos será um flash de felicidade num dia de trevas que serão as horas acordadas. O tempo e a paciência serão os melhores aliados no caminho íngreme dos apaziguamentos dos vários sentires: revolta, incredulidade, injustiça, recusa, negação e desistência de viver. É viver uma hora de cada vez, pensando que a hora do pôr do sol foi melhor passada do que a hora do nascer do sol. Somos assim, com pequenos momentos enfrentamos as maiores tragédias que nos acontecem. Muita resistência e apoio para estes pais para não desistirem deles próprios. A comoção é muito diferente dos demais: perderam os filhos que por acaso eram jogadores de futebol conhecidos por muitos. 

Na flor da vida: separada para sempre do homem escolhido para viver em pleno o amor e formar uma família é uma tremenda angústia de perder o norte. Com três crianças de colo a precisarem de cuidados e alegria e a viúva dominada pela dor sem consciência que as lágrimas serão um nó nas cabeças dos filhos e as explicações difíceis de compreender em corações tão pequenos e consciências ainda só formatadas para a ilusão da vida das brincadeiras e dos brinquedos. A força virá para levar o barco a bom porto. O desgosto do amor ceifado pela estrada irá atenuando com o passar do tempo. Ao olhar para os filhos virá sempre o rosto de alguém que deve ser celebrado para que eles tenham sempre presente o pai. Viver para eles será a missão,  evidentemente. A viuvez é um estado de alma por tempo incerto. Pode ser para toda a vida, contudo nunca deve ser amputada a possibilidade de um dia mais tarde tentar ser aquilo que queria ter sido: uma mulher casada a viver a sua paixão. Agora é viver a tristeza de ter perdido a vivência de um amor que gerou três lindos filhos para com coragem dar o colo que eles precisam. Ser o amortecedor da vida dos filhos, como todas as mães o são até ao último suspiro. 

Na flor da infância: Parte o coração ver os filhos de Diogo Jota. A tragédia acontecer no seu apogeu.  Infância e o resto da vida privados do amor do pai de forma física. A luta vai ser árdua o de manter viva a presença do pai no dia a dia de crianças muito pequenas. O mais velhinho terá memória do convívio, porém serão cada vez mais fabricadas e distantes. As fotografias,  a voz gravada dele terão o condão de criar momentos não vividos mas que parecerão que aconteceram na passagem cíclica dos anos. É uma esperança no meio de tanta desilusão e injustiça. Os pais deviam ser imortais enquanto os filhos não tivessem o álbum de recordações cheio de fotografias a testemunhar os momentos de crescimento e de concretizações aos quais todos nós merecemos ter a assistir o pai e a mãe na primeira fila. Será sempre um grande vazio dentro do coração destes três seres. Faltará sempre alguém. Por mais que tenhamos uma fotografia, um pertence a acompanhar-nos nos dias bons e principalmente nos dias maus,  nunca é a mesma coisa. Nunca terá o significado e o conforto de umas palavras de viva voz do nosso pai.

Em momentos de descompressão ouvimos: enquanto nós vivermos estará sempre viva a memória de quem partiu cedo. Não deixa de ser verdade. Contudo, é pouco para quem nunca teve ou se lembra do calor do beijo do pai ou simplesmente aquela gargalhada partilhada em momentos de pura brincadeira. O amor dos avós e da mãe serão a bagagem para serem homens e mulher conscientes de terem sido filhos de um futebolista respeitado mas filhos de um pai que teve pouco tempo de os acarinhar. O tempo é mestre em ajudar na justa medida de calar a dor e fazer sobressair a capacidade de amar quem não nos lembramos de nos ter abraçado. 

Na flor do quotidiano que os espera: Ouvi o Marco Caneira confidenciar que este era "o melhor dos piores dias". Arrepiei-me. Ao antigo jogador do Benfica morreu-lhe a sua filha bebé,  passou e passa por esta dor atroz de sufocante. A esperança de não ser verdade é alimentada com as  muitas horas que antecedem ao desfecho final: a descida do caixão à cova. Deixa-se de ver o corpo e aí começa o calvário. Os piores dias. O balão de oxigénio rebenta, a aceitação nunca chegará. Os pais estarão aprisionados à dor. Os filhos tentarão viver presos a memórias finas como a linha de croché. O silêncio depois da agitação fere. Nenhum pai devia perder filhos e os filhos deviam ter os pais até serem velhinhos. O amanhã, nunca será muito melhor, finge-se. As lágrimas serão um porto seguro da libertação do sofrimento, para abrir portas aos sorrisos que serão precisos para acompanhar o crescimento dos netos. É a vida a acontecer para os que ficam e têm de continuar na seda da busca da vida que é deles e tem de ser vivida o melhor possível. 

As flores são sempre a salvação de tudo e de todos. Na alegria e na tristeza, as flores são a mão quando nos sentimos vencedores e o beijo nos momentos de aflição. 

 

 

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