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Perspectivas & Olhares na planície

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O desassossego do "Normal"

O mote vai ser esta frase da Isabel Paulos, anfitriã do blogue "Comezinhas": "Quem me dera num ápice voltar ao mormal. É tudo". 

O que terá de tão sedutor voltarmos ao Normal, quando precisamente no dia anterior pretendíamos com a voz arrastada pelo cansaço mandar, com cuidado, esse normal pela janela com a garantia de não cair em cima de alguém sem culpa e magoar-se com o "teu normal". Será que é o sentimento de culpa a consumir a  mente, quando o ansiado diferente aparece, o Normal surge para desassossegar mais do que é normal? 

O normal veste muitas roupas.  O que é normal para mim, pode ser anormal para os outros.  Há quem viva no fio da navalha e achará isso normalíssimo. A rotina pode entrar no patamar do normal e odiarmos com todas as forças esse normal.  Porém, quando o anormal perturba a rotina do normal, caímos no desespero do sofrimento para pedir aquilo que queríamos virar costas.  A doença, nossa ou de quem amamos, a perda física de alguém de sangue, os azares financeiros,  no fundo os três D's a funcionar em pleno ou intervaladamente: Doença, desemprego e divórcio. 

O desassossego bate à porta, não há nada a fazer.

É um sentimento sentado num trapézio sem rede. 

O normal para além de vestir muitas roupas, pode calçar uns ténis bem como uns sapatos com um salto de quinze centímetros.

Virando o "normal" para outro prisma: genericamente afirmamos que "normal" é o comportamento que a sociedade considera apropriado, todavia o que fazemos e somos  em Portugal, pode não ser normal noutro país.  Pode haver um choque de normalidades. As normalidades na sociedade provêm da ideologia e da cultura (muitas vezes legislada), sem esquecer a mentalidade de cada nação. Mais, o que agora achamos normal, não o era há 50, 20 anos ou pode dar-se o caso de não ser daqui a muitos anos. Era normalíssimo a mulher não aprender ler e nem a escrever. Hoje em dia é considerada uma anormalidade tal situação.  Na comunidade cigana,  apesar de alguma evolução na conciliação da sua mentalidade de grupo com a nossa no que concerne ao ensino/instrução, ainda persistente o elevado abandono escolar. Infelizmente. 

De acordo com o filósofo Michel Foucault a normalidade implica uma relação de poder. Isto é, o poder classifica, ordena e controla. Tem o papel de decisor. Decide o que é ou está correcto em cada momento. Quem sai desses critérios (de "correcção") é classificado como estranho. Surgindo assim o grupo dos normais (indivíduos que seguem à risca a tabela dos critérios instituídos pela sociedade) e o grupo dos anormais/diferentes (aqueles que chocam e contestam as normas vigentes e por isso estão rotulados de esquisitos, loucos e diferentes). 

O interesse de Foucault neste assunto foi o simples facto de o filósofo ser homossexual, e na sua época, a homossexualidade era considerada anormal. 

(Não significa que se tenha extinguido esta visão nas muitas franjas da nossa sociedade actual e moderna. Pelo contrário, continuam a içar a bandeira da anormalidade.)

A feroz exclusão  social a que foi sujeito, incitou-o a dedicar o seu talento de pensador ao serviço de demonstrar algo que continua a criar celeuma: a destrinça entre o que é normal e o que é correcto. Os limites para definir a normalidade serão correctos? Quem os determina? A família, a política, as leis, as tradições e costumes culturais de um país ou a religião. Na realidade é tudo um pouco que vai determinar o que é a normalidade e o que é a anormalidade.  Não se conjuga o meio termo, por isso esta rigidez contribui para a radical bipolarização, resultando  comportamentos e atitudes reprimidas. Há quem deseja querer fazer parte do grupo dos normais, pois não quer ser olhado de forma diferente, teme repercussões negativas na carreira profissional e na vida familiar. Cimentou-se a ideia de que todas as coisas que fazemos têm de ser aceite pelos outros, independentemente de não ser aquilo que queríamos fazer. Logo, pode nascer um problema: as pessoas esconderem facetas da sua personalidade.

Apesar de tudo, ainda se considera uma anormalidade o homem chorar, tem de ser durão com nervos de aço. Em contraponto, as mulheres que não choram são conotadas de insensíveis, o normal é serem choronas. Há quem se deixe levar pela corrente da normalidade. Outros enfrentam a corrente e seguem pelas suas convicções e formas de encarar a vida fugindo à clausura da aceitação cega desta sociedade que promove a hipocrisia das coisas normais é que estão correctas e tudo o que foge ao normal é incorrecto, ilegal. Nem sempre. Ambas as posturas dão trabalho e podem resultar em muitos problemas. A esperança é sempre de regressar ao que se tinha. Sabendo que nada será o normal que tínhamos. 

É preciso saber balancear entre o normal e o anormal para sermos umas pessoas equilibradas, só assim somos mais felizes e resolvidos.

Ao vivermos o normal precisamos de quando em vez do picante da anormalidade positiva.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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