JMJ Lisboa 2023: Sentei-me, sem pressa fiquei (1)
"Nunca vos canseis de perguntar… Perguntar, é bom; aliás muitas vezes é melhor que dar respostas, porque quem pergunta permanece «inquieto» e a inquietude é o melhor remédio contra a rotina, que às vezes se torna uma espécie de normalidade que anestesia a alma."
Papa Francisco, Discurso na Cerimónia de Acolhimento (XXXVII Jornada Mundial da Juventude, Lisboa, 3 Agosto 2023).
1. A comunicação social diabolizou os o recurso aos contratos de ajuste directo, dizem eles excessivos, na compra de bens e serviços para serem utilizados na organização da Jornada Mundial da Juventude. O procedimento em si não está incorrecto, pelo contrato. O recurso a este método é um exercício de boas práticas e de transparência com o uso do dinheiro público. O que os jornalistas deveriam ter frisado com mais insistência, não foi o facto de ficarmos a conhecer a aquisição de 106 cabos de madeira para vassoura/esfregona, mas nestes contratos não terem sido de consulta prévia; ou seja, haver três empresas a apresentar orçamentos e não ser como foi, apenas uma empresa contactada. A insistência era nesse ponto. E nada mais. Em nome de alguma transparência, em boa hora existe a BASE com os contratos públicos à distância de um clique. Tomamos conhecimento, por exemplo, quais as oferendas que os municípios ofertam no Natal aos seus trabalhadores, quanto custam as festas e feiras promovidas pelas câmaras municipais de norte a sul, quanto dinheiro o Tony Carreira amealha do contribuinte e permite-nos descobrir que não é só a Igreja Católica Portuguesa a depender da esmola do pagador de impostos, também o senhor da passadeira das notas rosadas, o Bordalo II, é capaz de ter a casa de habitação paga à conta do erário público, pois até ao momento, encaixou mais de setecentos mil euros no somatório de contratos firmados com entidades públicas desde 2019. Tenho a leve esperança que no botão da campainha da mansão do rapaz tenha a seguinte frase: "obrigado contribuinte português por ter um tecto".
[Ora essa, não tem de agradecer, Bordalo II. Somos sempre solidários para aqueles vampiros que não assumem que são, mas são uns grandes sugadores do sangue deixado pelo cidadão na tesouraria das finanças.]
Ninguém está impoluto. Nomeadamente, as várias actividades artísticas que dependem enormemente do sector estatal para espalharem as suas criativas e talentosas manifestações de arte.
2. O flagelo dos incêndios florestais regressaram para grande ansiedade dos portugueses. Muitos hectares reduzidos a cinzas e muitas pessoas com perdas materiais totais ou parciais (não se consegue contabilizar as cicatrizes originadas pelo medo, pelo nervosismo da iminência das chamas consumirem o suor do trabalho) e os bombeiros a tentarem fazer autênticos milagres com os meios disponibilizados e a organização no teatro de operações que lhes é obrigatória a respeitar. Os Soldados da Paz, para bem e para o mal, ganham destaque na cobertura televisiva durante a intensa actividade de combate aos fogos florestais. Porém, não tiveram a mesma mediatização quando as treze corporações de bombeiros pertencentes ao distrito de Beja recusaram a proposta para participarem na Jornada Mundial da Juventude presidida pelo Papa Francisco. Para os palcos, principalmente para aquelas aberrações de escadas instaladas nos Parques Eduardo VII e Tejo/Trancão não se pouparam milhões, porém, a Autoridade Nacional de Emergência e Protecção Civil propôs migalhas: "pagar 10 euros cada ambulância por dia e 2,67 euros/hora aos operacionais."
Nenhum jornalista questionou esta miséria de pagamento. Podiam ter conciliado a "fiscalização" aos dinheiros gastos nos ecrãs para difundir as imagens dos acontecimentos em cima dos palcos com os outros itens da lista que compunham a logística da JMJ, nomeadamente, as condições em que os meios de socorro providenciados pelos bombeiros estavam a ser contratualizados.
Bem pode o Papa Francisco pregar até ficar sem voz que a "boa política" deve "corrigir os desequilíbrios económicos dum mercado que produz riquezas mas não as distribui, empobrecendo de recursos e de certezas os ânimos." (Extraído do discurso do Encontro com as Autoridades, com a Sociedade Civil e com o Corpo Diplomático).