Fazem falta “Teodoricos Raposos” no Governo de Portugal
“(…) a política é movida por cordéis tão sórdidos, que tudo é possível, desde que não faltem as mãos sórdidas para os puxar.”
Eça de Queirós
A atitude grotesca da excelentíssima ministra das finanças de Portugal nas reuniões do Eurogrupo para discutir a situação grega é do minino vergonhosa e no máximo inadmissível.
Os portugueses sentiram-se afrontados com a vaidosura da ministra Maria Luís a fazer o “servicinho” sujo da Alemanha como se o Governo de Passos Coelho / Paulo Portas tivesse governado maravilhosamente e cumprido todas as metas sistematizadas no Memorando da Troika e principalmente tivesse implementado as reformas estruturais que realmente o país precisa.
A vaidade excessiva da ministra caiu ridiculamente por terra quando a Alemanha aceitou o pedido da Grécia em alargar o prazo com as medidas de cortes propostos por Atenas e a Comissão Europeia colocar Portugal sob vigilância apertada, dizem eles porque as dívidas externa e interna são preocupantes e uma vez que Portugal não está com o programa da Troika e os problemas subsistem e em muitos casos avolumaram-se (desemprego, dívida soberana…). Ora bem tentam desencostar-se da Grécia e colar-se à Irlanda, todavia, estamos mais colados à Grécia e desencostados da Irlanda.
Nós nunca fomos a Irlanda, toda a gente sabe ou devia saber isto: o governo irlandês com o auxílio dos empréstimos da Troika resolveu o problema conjuntural (questões relacionadas com os bancos), fez os ajustamentos estruturais que necessitava e voltou a ser um país viável social, económica e financeiramente.
Nós sempre fomos mais parecidos com a Grécia, toda a gente sabe ou deveria saber isto: o governo português com o dinheiro da Troika resolveu problemas estruturais com soluções conjunturais, logo os ajustamentos estruturais não se fizeram e retornámos ao país social, económica e financeiramente inviável.
É angustiante para qualquer cidadão com a mente sã ver a ministra das finanças de Portugal deixar-se utilizar pelo ministro alemão Wolfgang Schauble como se fosse a nova atração, uma espécie rara, de um qualquer Jardim Zoológico. Uma de duas: ou a ministra está a trabalhar para conseguir um cargo na União Europeia, ou o que o novo Governo de Tsipras veio provar é que podíamos ter feito finca-pé às ordens da Alemanha e mesmo precisando do dinheiro poderíamos ter sido mais inteligentes em adoptar as medidas de austeridade onde eram realmente obrigatórias e assim, este Governo Passos Coelho / Paulo Portas é um somatório de erros e falhanços dolosos e graves.
Às vezes penso que os nossos governantes deviam ter mais respostas à Teodorico Raposo1 e seriamos melhor representados nos “convívios” da União Europeia:
“O erudito Topsius resmungou, alçando o bico com petulância, que a Alemanha era a mãe espiritual dos povos…
- O brilho que sai do capacete alemão, D. Raposo, é a luz que guia a humanidade!
- Sebo para o capacete! A mim ninguém me guia! Eu sou Raposo, dos Raposos do Alentejo!... Ninguém me guia senão Nosso Senhor Jesus Cristo… E em Portugal há grandes homens! Há Afonso Henriques, há o Herculano… Sebo!2
Desgraçadamente, é uma pena o Teodorico Raposo não ser a ministra Maria Luís, dado que o Topsius é tal e qual o ministro Wolfgang Schauble:
“(…) o doutor Topsius (…) era também intoleravelmente vaidoso da sua pátria. Sem cessar, erguendo o bico, sublinhava a Alemanha, mãe espiritual dos povos; depois ameaçava-me com a irresistibilidade das suas armas. A omnisciência da Alemanha! A omnipotência da Alemanha! Ela imperava, vasto acampamento entrincheirado de in-fólios, onde ronda e fala de alto a Metafísica armada! Eu, brioso, não gostava destas jactâncias. Assim, quando no Hotel da Pirâmides nos apresentaram um livro, para nele registarmos nossos nomes e nossas terras, o meu douto amigo traçou o seu «Topsius», ajuntando por baixo, altamente, em letras tesas e disciplinadas como galuchos: - «Da IMPERIAL ALEMANHA». Arrebatei a pena; e recordando o barbudo João de Castro, Ormus em chamas, Adamastor, a capela de S. Roque, o Tejo e outras glórias, escrevi largamente, em curvas mais enfunadas que velas de galeões: «RAPOSO, PORTUGUÊS, DE AQUÉM E DE ALÉM-MAR».”3
O veto deve ser usado convenientemente e a nossa presunçosa ministra das finanças merece-o. E desta feita não conseguir um emprego, perdão, um cargo de extrema relevância e prestigio para a nação de Portugal na União Europeia; foi esta a etiqueta atribuída em Portugal às funções do Durão Barroso e agora ao lugar do pouco bejense Carlos Moedas. Não serve para Portugal também não serve para a União Europeia, embora: “(…) a política é movida por cordéis tão sórdidos, que tudo é possível, desde que não faltem as mãos sórdidas para os puxar.”4
Isabel
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1 Teodorico Raposo: personagem do romance A Relíquia de Eça de Queirós.
2 /3 Excertos do romance A Relíquia de Eça de Queirós.
4 Citação retirada de uma das cartas de Eça de Queirós enviadas a Oliveira Martins.