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Perspectivas & Olhares na planície

Perspectivas & Olhares na planície

As mulheres portuguesas e ucranianas lado a lado

"— Ambições! As mulheres não têm ambições, têm oportunidades."

Agustina Bessa-Luís, Antes do Degelo.

Mais uma vez as mulheres estão a viver uma prova de fogo. 

Sou solidária com o desespero, a angústia, o medo, a impotência, a tristeza das mulheres ucranianas que estão a viver neste momento.

A todo o custo tentam salvar o futuro da Ucrânia: as crianças e os adolescentes e atravessam as fronteiras para pedirem asilo temporário. 

Carregam às costas as malas de viagem invisíveis cheias de esperança de retornarem à sua pátria sãs e salvas para reencontrarem "quem" deixaram. "O que" deixaram fica para segundo plano quando está em evidência a vida.

É uma mala mais pesada que aquela que transportam o que se pode guardar numa mala: quase nada. Umas simples mudas de roupa e quiçá um álbum de fotografias para que as memórias felizes não se percam no meio de tanta preocupação de terem uma vida destruída por causa de um capricho de um sociopata que invade um país e que ataca infra-estruturas civis para atingir a loucura de ocupar um país soberano sem apelo nem agravo.  As memórias felizes são as malas que recorremos para encher-nos de resistência para não fraquejar perante aqueles que são muitas vezes as razões para não desistirmos: a família. 

As mulheres ucranianas têm a missão de manter a chama da vela acesa para elas de forma a conseguirem dar força aos filhos que carregam outra vez, não no ventre,  mas são os olhos e as pernas destes seres que não merecem estar a passar este desumano sofrimento de terem sido arrancados à força das suas rotinas diárias, dos seus quartos,  dos convívios familiares com avós, tios e pais. Esses, os pais, ficaram em solo ucraniano a lutar pela própria vida e pela vida da nação. 

Como a mulher sobrevive à angústia de ter de abandonar quase tudo?

Quase, escrevi bem, muitas das mulheres deixaram lá marido, filhos adultos, pais. 

E aquelas que ficaram para ingressar na tropa ou têm profissões que são indispensáveis em contextos de acontecimentos desta monta como os que a Ucrânia está a passar. Merecem ser destacadas, também. 

É preciso calçar os sapatos dos outros para melhor compreender a dimensão da injustiça que estas mulheres estão a suportar.

Mesmo assim é inimaginável.

Facilmente, para as evidenciar,  chamamos de heroínas. 

Eu não caio no elogio fácil. Não gosto de chamar às mulheres de heroínas.  Sabem a razão? Não existem heróis.  Todos os heróis têm pés de barro. 

As mulheres são pedaços de gente com defeitos e virtudes.

São aquele porto de abrigo quando tudo arde até se tornar pó de cinza.

São a luz que quando se apaga nos agarram na mão com força para serem os nossos olhos na escuridão para seguirmos a caminhada sem grandes tropeços até que  a luz volte a acender. 

Se estivesse nas mãos das mulheres davam a vida para que os filhos nunca vivessem no corpo e na mente uma guerra sem explicação. 

A mulher portuguesa é assim.

A mulher ucraniana é assim.

Regra geral, independentemente da nacionalidade, credo, raça, instrução académica, a mulher é assim. 

A história é construída de realidade(s). A realidade da mulher portuguesa: "dados compilados pela base de dados Pordata mostram que a desigualdade salarial entre homens e mulheres aumentou durante a pandemia."

É a nossa própria realidade.  Temos ambição.  O problema da nossa ambição é ser dependente das oportunidades que construímos.  Nós criamos as oportunidades no meio das nossas mil e uma tarefas que nos impõem, que nos auto-impomos e a partir daí corremos atrás até que essa oportunidade se torne nossa.

Seríamos capazes de criar melhores oportunidades para atingirmos o topo da nossa carreira profissional? Sim, seríamos. 

A questão é que enquanto construímos oportunidades ludibriando as nossas contingências tatuadas no nosso corpo num mercado de trabalho português muito ideológico e restritivo, por sua vez, os homens usufruem das oportunidades construídas sem se preocuparem de as criar.

Antes do M, tem estado sempre o H para aquela oportunidade que nasce a cada hora no mercado laboral competitivo. 

Porém,  o paradigma está a mudar.

Lentamente,  é um facto nesta realidade em que a mulher portuguesa está inserida. 

As alterações da mentalidade não mudam como se de uma lâmpada fundida  trocada se tratasse. 

Resta-nos incluir mais uma tarefa às infindáveis que acumulamos: sermos as electricistas de serviço para trocar as lâmpadas fundidas que muitas cabeças teimam em não querer trocar. 

O calendário marca:  quinta-feira, 10 de Março de 2022, não há melhor dia para escrever: Feliz dia da Mulher.

Quando só nos felicitam a 8 de Março...

...Para mim faz mais sentido nos outros dias do ano! 

 

 

 

 

 

 

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