Ai os antidepressivos!
Segundo o relatório da OCDE, Portugal ocupa o quinto lugar dos países em que se consome mais antidepressivos. Há frente de nós estão países como: a Islândia, o Canadá, a Austrália e o Reino Unido.
A maravilha maior é quando o relatório anuncia que a toma de antidepressivos aumentou o triplo (tendo como referência o intervalo temporal de 2000 a 2017). Ou seja: "Portugal apresentava em 2017 um consumo de 104 doses diárias de antidepressivos por mil pessoas, quando em 2000 pouco ultrapassava as 30 doses diárias."
A “Health at Glance 2019” considera que: “o aumento do consumo de antidepressivos pode refletir melhorias no reconhecimento e diagnóstico da depressão, a disponibilidade de terapias e a evolução de guias de orientação clínica.”
Tendo a concordar. Porém, este aumento excessivo de consumo de antidepressivos não estará na sua génese a abusiva prática dos médicos de clínica geral em passar a receita médica com o dito antidepressivo? Quantas pessoas tomam esses comprimidos e nunca foram a uma consulta de especialidade? É mais fácil recorrer ao médico de família do que explicar que fomos “conversar” com o psiquiatra. Há o estigma que só os malucos vão às consultas de psiquiatria.
E quando vão, já com muitos anos de toma de antidepressivos e o psiquiatra recomenda o fim da prática, pois não precisa ou melhor nunca precisou?! Acontece...
Pergunto-me: o médico de família pode substituir-se ao psiquiatra? Ou mais grave, terá competência para fazer um diagnóstico que distinga uma depressão de um desequilíbrio emocional temporário originado pelo cansaço? Por exemplo, está avalizado para diagnosticar a bipolaridade?
Estar triste de manhã e no dia seguinte estar mais umas horas taciturno não significa que estejamos com depressão.
Infelizmente, todos conhecemos alguém que toma antidepressivos e nunca foi a uma consulta de psiquiatria (nem no privado).
É um facto que muitas vezes levam à exaustão a exigência feita ao médico de família de uma receita médica com o ansiolítico, o calmante, o antidepressivo… Tomam-se com a mesma leveza (in)consciente como se toma um paracetamol.
Quando ouvi esta notícia na rádio automaticamente lembrei-me da personagem Cabé do romance Conhecimento do Inferno da autoria do António Lobo António.
Lembrei-me do hilariante Cabé porque para resolver o sarilho onde estava metido decidiu fugir para o Hospital Miguel Bombarda para ser internado como louco. O sarilho era: tinha o casamento marcado pelos irmãos da noiva, e o Cabé não podia casar, uma vez que já era casado.
“ –Quero ser internado porque estou maluco”.
“(...) – Se os irmãos da noiva me caçam fazem-me a tromba em oito. E a agitar as rendas dos pulsos num apelo patético:
– A única maneira de me safar é aceitarem-me por maluco no hospital.”