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A realidade é mais crua do que estas frases feitas com o intuito de fazer despertar os pais que é preciso mudar a forma como gerem a logística familiar com os filhos.
O professor Carlos Neto tem toda a razão, aliás as vezes que é chamado para dar a sua visão sobre os métodos educacionais e hábitos sociais adoptados pelos pais nestes últimos 20 anos (ou mais): as crianças não brincam ao ar livre, as crianças estão a perder motricidade, as crianças não andam a pé, não andam de bicicleta, etc.
Porém, na prática quais seriam as soluções para as crianças não serem "vítimas do trabalho dos pais", e dessa forma evitar que passem "a maior parte tempo na escola"?
Em tempos idos a dinâmica familiar não era discutida e não havia este constante acordar para este problema, porquê? A resposta é fácil: a maior parte das vezes a mulher ficava em casa a cuidar dos filhos. Os filhos não estavam horas a fio na escola, aqueles que iam e os que não estavam sempre na companhia da mãe e em famílias numerosas os irmãos tomavam conta uns dos outros, mas mesmo assim a figura maternal tinha essa tarefa em exclusivo para si.
Foi com o sacrifício das mulheres de prescindir de uma carreira tributiva que lhe desse independência monetária no futuro quando entrassem na hora da aposentação e hoje muitos filhos, maridos, família e inclusive governantes desprezam-nas e criticam-nas quando estas mulheres dizem a razão da reforma ser baixa. Não foi por malandrice, foram mães que arrumaram como uma peça de roupa a mulher para serem donas de casa e viverem para o bem-estar dos filhos e não estarem dependentes de familiares. O que hoje se debate é o tempo excessivo que as crianças passam na escola, sendo que nos anos 70, 80, 90 não existia a oferta de actividades extra-curriculares, actualmente, por via das circunstâncias de ambos os pais estarem empregados, ser cada vez mais uma regra, a escola pública foi encontrando soluções de forma a auxiliar nesta nova realidade. Os primeiros ciclos de ensino a terminarem as aulas às três horas e trinta minutos – quais os empregos que conseguem sair às três e tal da tarde? – manifestamente não há trabalho com este horário. Nem todas as actividades económicas podem ter escalas de horários a tempo parcial e como é lógico a remuneração é menor e nos tempos que correm em que os preços das rendas/prestações da casa, a alimentação, os combustíveis, ou seja, todos os bens e serviços indispensáveis à sobrevivência de um agregado familiar terem encarecido sobremaneira, por isso é imperativo que o casal esteja empregado e assim a grande necessidade de colocar os filhos nas actividades complementares propostas pela escola. Por vezes, estas não são suficientes para conjugar com o horário laboral de um dos pais – a sacrificada continua a ser a mulher – e não havendo uma rede familiar disponível recorre-se ao pagamento de centros de estudos e de actividades várias para que os filhos menores estejam em segurança até que alguém os leve para casa. É esta a realidade. Nem sempre há uma avó, nem sempre há uma tia. Nem sempre. O remédio é ficarem ao cuidado de monitores até que consigam ir para junto dos pais.
Acresce o facto: a maternidade acontece cada vez mais tarde, os avós estão numa fase já adiantada da sua "juventude" depois de um passado de muitos anos com a conjugação do trabalho remunerado e não remunerado, por conseguinte a disponibilidade física e emocional a entrar na curva descendente, ficando o seu papel de retaguarda condicionado. Aliás, muitas destas avós dedicaram-se a ser mães a tempo inteiro, ter a responsabilidade de outra vez a seu cargo a rotina de crianças às costas é deveras injusto, apesar dos avós nesta condição nunca se negarem e fazerem das tripas de coração para auxiliar os filhos nesta tarefa de substituição dos pais por umas largas horas dos dias, semanas, meses e anos.
Ficar horas a fio entregues a pessoas estranhas ao núcleo familiar é o melhor para a educação e formação de uma criança? Claramente que não é.
E o que propõem?
A escritora Lídia Jorge dedicou algumas frases sobre este drama em que os filhos dos pais a trabalhar vivem? Esta actualidade, com superior interesse, é que deve ser trabalhada em discursos e não só abordar assuntos gastos de tanto enaltecidos de um passado longínquo em que nada se pode fazer para modificar todas aquelas acções condenáveis à luz das leis e da mente contemporâneas. As horas em contexto escolar ou em centros de actividades averbadas na caderneta da vida das nossas crianças que são mais do que o horário laboral de um funcionário público de uma autarquia é que devia preocupar estas ilustres pessoas a discursar em datas importantes na História de Portugal.
Será medo?
Medo de suscitar a questão e ao apontar o caminho é regressar a um tempo ido que a mulher não merece, não quer e não é justo voltar?
A solução está à frente do nosso nariz, porém ninguém quer comprometer-se com ela. Como este "problema" surgiu com a entrada da mulher no mundo laboral mais qualificado, era negociar um retrocesso da vida profissional da mulher e regressar a uma dependência salarial vinda em exclusivo do marido/companheiro. No entanto, é inviável e em muitos casos completamente impossível, uma vez que, os casamentos para a vida acabaram, há novas realidades familiares construídas: mães divorciadas com filhos em regime de guarda total, segundos casamentos com filhos de parte a parte e não é negociável não trabalhar. Viver de apoios do Estado também não é um remédio quando os subsídios da nossa segurança social não ombreiam com os de outros países europeus.
É inegociável a mulher anular-se profissionalmente pela circunstância de não se querer um regresso ao passado e o assegurar da subsistência financeira de uma família não se coadunar com os padrões de outrora, as exigências familiares e pessoais são diferentes e requerem mais saldo na conta bancária.
Os reajustes são obrigatórios. Mas, os sacrifícios não podem pender sempre para o mesmo lado da balança.
Assistimos impávidos e serenos à precariedade familiar em conluio com a laboral, uma bomba relógio está em desenvolvimento e não se sabe quando vai rebentar. Delegar a educação base dos filhos às instituições de ensino é um erro que se está a pagar caro. A autoridade dos pais na vida dos filhos está a perder-se uma vez que as horas do dia não esticam e adoptam outra forma de educar recorrendo aos bens materiais e na regra de não contrariar os impulsos e atitudes para não haver discussões.
Melhores dias virão, enquanto não chegarem, haja lucidez e não viver nestas bolhas de problemas escritos nos dedos esticados, sem o arrojo de apresentação de possíveis respostas para os resolver e de forma velada culparem a escola e a família de sujeitarem os filhos a grandes cargas horárias escolares. Quando a escola se foi ajustando às exigências naturais de uma sociedade moderna, onde o homem e a mulher têm de trabalhar para, enquanto pais, proporcionarem aos filhos uma vida digna.
Todavia, há quem se desculpe com o trabalho para "abandonar" os filhos horas injustificáveis em actividades lúdicas ou a cargo dos avós quando pura e simplesmente os pais se demitem da tarefa de ser pais. Fica para outra vez, desenrolar este novelo.