"Vivemos uma época de evasão, distracção, superficialidade, desencanto, apatia e passividade. Este contexto cria um desânimo subjectivo, um vazio interior, que resseca a vida e acaba por trivializá-la, reduzindo todas as dimensões profundas da realidade a mera superficialidade."
J. Conill, El Crepúsculo de la Metafísica.
I. Em Dezembro recebi na minha caixa do correio um mini-folheto com a fotografia do cabeça de lista do PS para o círculo eleitoral de Beja com a seguinte frase: "A voz consequente do Baixo Alentejo". Quem escreveu este slogan conhece bem as políticas do governo central aplicadas no Baixo Alentejo que se resumem a um redondo nada. NADA. Por isso, de facto é uma voz consequente, uma voz coerente em manter o registo frouxo na exigência da concretização dos investimentos básicos para o desenvolvimento do distrito de Beja.
O mini-folheto é um chorrilho de juízos de valor quando se pretende é que haja juízos de facto. Ou seja, são juízos que valorizam certos acontecimentos, acções e ideias em vez da existência de juízos que descrevam a realidade ou informam sobre factos, acções ou acontecimentos.
Linha a linha:
♧ "Os Baixo Alentejanos não são de deixar o trabalho a meio".
A grande questão é que o trabalho não iniciou, como pode estar a situar-se no estádio intermédio? Está tudo por começar... inclusive o trabalho de sensibilizar este Governo defunto que não somos portugueses de segunda.
♧"Dei voz aos problemas e aos desafios das nossas terras, com sentido de construção de respostas para as pessoas".
Há anos e anos que se sabem quais os problemas que têm de ser resolvidos com urgência, não é necessário a voz, mas acções tais como desbloquear as verbas financeiras para realmente existir uma justa distribuição de riqueza e exista a coesão social.
♧"Dei voz à identidade do Baixo Alentejo".
Chavões de bafio que se lhe perguntar o que é a identidade Baixo Alentejana responde com as banalidades institucionais redutoras onde se inclui o cante alentejano e nem planícies quase temos usurpadas pelas oliveiras feias que aprisionaram a ideia da imensidão e do perder de vista que as planícies nos ofereciam.
♧ "Dei expressão à defesa do Mundo Rural perante os ataques a que esteve sujeito, de quem não conhece a realidade, os equilíbrios e as dinâmicas das nossas terras".
O maior inimigo do mundo rural é o deputado que só se entretém com os pormenores quando temos uma monocultura que irá destruir as terras de cultivo e inclusive estão a alastrar nos "barros de Beja" que são só as terras de primeira que o Baixo Alentejo tem. Com a escassez de terras para o gado de pastoreio destrói por completo os produtos que daí se fabricam: queijo, enchidos, mel e passamos a ter carne de borrego e porco do "aviário". Não há um plano estratégico de desenvolvimento sustentável do Mundo Rural. Isso sim era defender com garra o distrito que o elegeu.
♧"Defendi o direito às tradições, a ter soluções no presente e a ter um futuro com esperança".
Quais tradições? A caça? A tauromaquia? A caça desde que não haja excesso de plantações de olival, a caça vai existindo com as associações de caçadores a tratar de alimentar os animais nas reservas que entretanto conseguem não morrer ao ingerir o zinco. A tauromaquia não está em extinção, não é por meia-dúzia de seres que se colocam com megafones à porta das praças de touro a gritar impropérios que as touradas vão acabar. Esses seres deviam era com o megafone apresentarem-se à porta daquelas pessoas que abandonam os familiares idosos nos hospitais. Isso é que é desumano. E o Pedro do Carmo aproveitava e pedia o megafone para gritar à porta do seu líder socialista a crueldade que é as grávidas, os doentes com doenças graves terem de ir para o hospital de Évora pois o hospital de Beja não tem operacionais as valências básicas de um hospital distrital. Que esperança teremos nós neste presente de nos sentirmos que nunca somos prioritários quando estão em cima da mesa as decisões de investimentos estruturais que servem este presente e constroem o futuro? A esperança para quem vive sem preocupações de lutar pelos serviços básicos estatais (e privados) não é a mesma para quem tem de reivindicar o mínimo de serviços e infra-estruturas em localidades com pouca densidade populacional.
♧ "Procurei estar sempre ao lado da solução, em vez de sublinhar o problema."
Refere-se, por exemplo, à solução de uma previsão que é electrificação da linha ferroviária ficar para 2025 ou 2027? Que rica solução. É uma solução não para resolver o problema, mas antes tentar apagar da mente a injustiça de não termos direito a uma linha ferroviária electrificada até Beja.
♧"Este trabalho e o caminho de construção de novas respostas para as pessoas e para as nossas terras foi interrompido com o chumbo de um orçamento de Estado que trazia mais e melhores soluções para a Região e para o País".
Para o país chamado Lisboa acredito, porém para o Baixo Alentejo não trazia novidade nenhuma. Uma vez que os tais projectos estruturantes só há previsão de serem adjudicados a partir de 2025. A chantagem mesquinha de achar que podem comprar todos os baixos alentejanos com artimanhas falaciosas demonstra o carácter ignóbil dos nossos representantes políticos.
♧ "A 30 de Janeiro, a opção é entre a continuação do caminho de responsabilidade e esperança ou o regresso à governação da autoridade do tempo da Troika."
O mais batido recurso ao argumento ad baculum, i.e. quando os argumentos racionais rareiam, socorre-se ao medo, à lei da força: se não votarem em nós, já sabem que regressa o autoritarismo no corte dos subsídios sociais, ao desinvestimento nos sectores da sociedade onde predomina o Estado. O papão que vem assustar e fazer a vida negra aos cidadãos portugueses. Para além, do já gasto argumento ad terrorem. Para os resistentes que continuam a viver no distrito de Beja não faz diferença, assim como assim a Troika saiu e continuamos a ter as terras expropriadas sem nenhum quilómetro de alcatrão de auto-estrada lá adormecido.
♤" Por mim, continuarei a ser uma voz consequente do Baixo Alentejo e do Mundo Rural, ao vosso lado, como sempre. A escolha é dos Baixo Alentejanos."
Por mim, está decidido para quem nunca esteve ao lado dos Baixo Alentejanos, o meu voto é Não. Não voto em Pedro do Carmo.
II. Não respiro oxigénio, respiro raiva que circula fervorosamente pelas minhas veias até os meus olhos ficarem raiados a vermelho de fúria com o facto de, naturalmente, o Pedro do Carmo vai ser eleito deputado para desprestigiar o distrito de Beja. Se houvesse capacidade de uma avaliação honesta e competente do trabalho realizado em prol do desenvolvimento e melhoria da qualidade vida efectiva dos Baixo Alentejanos ninguém votaria na lista do Partido Socialista. Tudo ficou igual. Mais, tudo aquilo que entrou na senda da degradação desenfreada está atingir o epíteto da ruína: hospital de Beja a parecer um centro de saúde da área metropolitana de Lisboa, estradas esburacadas enfeitadas com cada vez mais sinais de trânsito com a frase "piso em mau estado"; auto-estrada com o projecto esquecido numa gaveta; linha ferroviária antiga à imagem do terceiro mundo, tribunal por construir; aeroporto apto para ser cenário de telenovelas; plantação selvagem de oliveiras e amendoeiras de super intensivo que qualquer dia, com a escassez de terra disponível, aldeias com 100 habitantes, estes são obrigados a mudar de morada e as casas serão varridas como entulho para assim dar lugar a mais oliveiras para que o azeite continue caríssimo.
Não compreendo este espécime de gente que não tem vergonha, não sente vergonha de se apresentar na lista de candidato a deputado depois de não ter feito finca-pé para pelo menos uma grande carência estrutural tivesse sido resolvida. Nunca vi firmeza em contrariar as ordens do primeiro-ministro António Costa. Agora faz campanha como se estivesse a candidatar-se pela primeira vez a cabeça de lista pelo círculo eleitoral de Beja. Pedro do Carmo é alguém do aparelho do Partido Socialista que está para servir os interesses do partido e a conseguir a sua sobrevivência no mundo do emprego político. A insensibilidade perante as dificuldades de um distrito em competir com outras regiões que têm as infraestruturas essenciais a funcionar em pleno é uma tarefa hercúlea que não o impressiona.
É triste para alguém que se diz Baixo Alentejano não colocar a mão na consciência e admitir que está a fazer muito pouco num distrito que nos últimos seis anos foi abandonado e descartado e que o primeiro-ministro defunto só se lembra de nós quando há eleições. Eu sinto-me quando somos discriminados e ignorados levianamente.
Quem não se sente, não é filho de boa gente. E eu sou filha de boa gente...